Após o susto provocado pela pandemia da Covid-19, que derrubou o consumo nacional e internacional de etanol, o setor fecha a safra com alta de 3,6% na produção de cana e se prepara para uma nova temporada, ainda repleta de incertezas
A imagem de uma montanha-russa é a mais adequada para o mercado sucroenergético em 2020. Mesmo não se esperando recordes, as expectativas feitas em janeiro e fevereiro apontavam que a safra 2019/2020 seria melhor que a anterior. Em março, o tempo fechou sobre os canaviais. A Covid-19 foi classificada como pandemia. Tudo indicava que o isolamento social derrubaria o consumo de etanol. As poucas usinas capazes de alterar o mix de produtos, privilegiaram o açúcar.
Passados dois meses, o temor deu lugar uma quase euforia. O setor encerrou a temporada comemorando uma safra de 642,7 milhões de toneladas de cana-de-açúcar colhidas, 3,6% mais que os 620,4 milhões de toneladas do período anterior. O resultado foi suficiente para consolidar o Brasil como líder na produção mundial.
Para 2021, o setor espera que as metas do Renovabio ajudem a impulsionar o consumo do etanol no País
O volume expressivo foi resultado da chuva na hora e na medida certas. A ajuda dos céus melhorou a qualidade das plantas e elevou os Açúcares Totais Recuperáveis (ATR), a capacidade da matéria-prima ser convertida em açúcar ou álcool, dependendo dos coeficientes de transformação de cada unidade produtiva. Na região Centro-Sul, responsável por mais de 90% da produção do País, foram colhidas 589,9 milhões de toneladas. A produtividade subiu 5,1% para 78,1 mil quilos por hectare, ante os 74,3 mil da safra 2018/2019. “A expansão da moagem, aliada à melhora da qualidade da matéria-prima, refletiram-se na maior disponibilidade de produto, convertido majoritariamente em etanol”, disse Antonio de Pádua Rodrigues, diretor técnico da União da Indústria da Cana-de-Açúcar (Unica).
O ATR por tonelada no Centro-Sul passou de 137,88 quilos no ciclo 2018/2019 para 138,57 quilos em 2019/2020, somando 81,8 milhões de toneladas de ATR. Desse total, 65,7% foram convertidos em etanol e 34,3% em açúcar, confirmando a trajetória da indústria de ser mais alcooleira do que açucareira. A produção de etanol também surpreendeu, chegando a 34 bilhões de litros. O tipo hidratado, vendido nos postos, 23,9 bilhões de litros. O tipo anidro, misturado à gasolina e usado em fórmulas farmacêuticas e de cosméticos, respondeu por 10,1 bilhões de litros.
Exportação
Segundo maior produtor de biocombustíveis do mundo, atrás somente dos Estados Unidos, o Brasil ganhou participação no mercado global e elevou seu faturamento, apesar da queda dos preços e do encolhimento do consumo mundial. Segundo dados da Secretaria da Indústria, Comércio Exterior e Serviços, vinculada ao Ministério da Economia, o País exportou 2,2 bilhões de litros de etanol de cana nos dez primeiros meses de 2020, alta de 38% ante o 1,6 bilhão de litros exportado no mesmo período de 2019.
Esse aumento nas vendas compensou a queda de 14% nos preços médios, que recuaram para US$ 442,51 por mil litros. O resultado foi uma alta de 15,9% no faturamento, que subiu de US$ 820 milhões em 2019 para mais de US$ 950 milhões em 2020.
A produção do açúcar também cresceu. Totalizou 29,8 milhões de toneladas, 2,6% mais que na safra 2018/2019, segundo a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). O embarque de açúcar de cana em bruto cresceu 67,7% entre janeiro e outubro. Foram 21,9 milhões de toneladas, ante 12,61 milhões de toneladas no mesmo período de 2019. O faturamento foi de US$ 6 bilhões, alta de 67,7%.
A China foi o principal importador, adquirindo 26,3% do total. “Em janeiro e fevereiro de 2020, o câmbio favorável e déficits na produção mundial tornavam o mercado de açúcar mais promissor”, afirmou Pádua. Isso deve continuar no futuro próximo. Para a safra 2020/2021, que começou a ser colhida em novembro, projeta-se uma produtividade média de 77,3 quilos por hectare. Segundo Pádua, a forte seca entre abril e outubro do ano passado prejudicou o desenvolvimento das plantas e facilitou incêndios criminosos, que destruíram canaviais novos. A falta de chuva também atrasou o plantio, o que pode prolongar a colheita até o mês de março. “Mesmo com todos os desafios essa safra não será tão afetada”, disse Pádua.
Ele alerta que o cenário pode não ser tão favorável na safra 2021/2022. No entanto, se as chuvas voltarem a cair no primeiro trimestre de 2021, a oferta de cana vai crescer. As exportações de açúcar devem ser beneficiadas, pois a Tailândia, um dos maiores produtores globais, ainda sofre com as secas e deve registrar uma queda de 2,6% em sua safra 2020/2021.
Não há certezas sobre quando a demanda do etanol voltará aos níveis pré-pandemia. Um impulso virá da Renovabio, Política Nacional de Biocombustíveis, cujo objetivo é expandir a produção de combustíveis não derivados do petróleo, como etanol, biodiesel e biometano. Uma das medidas é a obrigatoriedade de adicionar até 13% de biodiesel no combustível a partir de março de 2021.
Fonte: Revista Dinheiro Rural / IDEA